Audiência Pública da EJE-BA debate soluções para reduzir a violência de gênero e ampliar a participação feminina na política
Evento contou com palestras, falas de autoridades e propostas sobre o tema “Mulheres e cidadania”

O marco histórico dos 93 anos do voto feminino foi o ponto de partida para a Audiência Pública “Mulheres e Cidadania”, a primeira organizada pela Escola Judiciária Eleitoral da Bahia (EJE/BA). O evento ocorreu na segunda-feira (24/2), no Auditório Desembargadora Olny Silva, do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA) e reuniu autoridades públicas, magistrados(as), professoras, coletivos, advogadas e representantes de partidos para debater sobre violência de gênero e participação feminina na política.
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Na abertura, o presidente do Tribunal Regional Eleitoral da Bahia (TRE-BA), desembargador Abelardo da Matta traçou um panorama da Justiça Eleitoral desde sua criação até a consolidação da democracia no país, destacando, contudo, a crise de representatividade. “Dar voz à sociedade é um dos pilares mais relevantes do regime democrático e uma das principais razões de assistência da Justiça Eleitoral nos seus 93 anos de história”, afirmou.
O diretor da EJE-BA, desembargador Moacyr Pitta Lima, ressaltou o caráter propositivo do evento, cujo objetivo foi diagnosticar os principais desafios e colher propostas para enfrentá-los. “Precisamos ouvir efetivamente qual é a maior dificuldade e o que a Justiça Eleitoral e os outros atores desse processo podem fazer para modificar essa realidade”, destacou.
A ministra substituta do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e vice-diretora da EJE/TSE, Vera Lúcia Santana Araújo, relembrou momentos históricos em que o direito ao voto foi cerceado no Brasil. Compartilhou sua experiência pessoal ao votar pela primeira vez na Assembleia Constituinte em 1986 e destacou o papel histórico da Bahia na luta por direitos. “Essa audiência pública faz uma provocação a que assumamos o nosso papel na história. A Bahia tem uma tradição libertária, somos a terra de Maria Felipa, de Luíza Mahin e de Maria Quitéria. Nosso destino está em nossas mãos”, afirmou.
Palestras
Duas palestras enriqueceram o evento. A professora da USP e doutora em sociologia, Eva Blay, abordou a influência de movimentos históricos na transformação das relações de gênero, destacando as guerras, mudanças políticas e econômicas e a resistência ao patriarcado. Lembrou que a Constituição de 1988 foi a primeira a garantir o direito à vida das mulheres e questionou se as mudanças legais refletiram na sociedade. “Mudou a lei, mas mudou a sociedade? Não! Ela vai mudando aos poucos, tem que mudar também a cabeça, o comportamento, os valores. O que significa patriarcado e cidadania deve ser ensinado no cotidiano”, concluiu.
Já a professora da UFBA e doutora em Estudos Interdisciplinares sobre Mulheres, Gênero e Feminismos, Salete Maria da Silva, tratou do combate a violência política de gênero e das deficiências da legislação brasileira. Sobre a Lei 14.192/2021, que estabelece normas para prevenir, reprimir e combater a violência política contra a mulher, reconheceu sua importância, mas apontou seu caráter restritivo. “É uma regra bastante limitada. Ela foca nas mulheres já eleitas e candidatas, deixando sem nenhuma proteção as pré-candidatas, ativistas, militantes e defensoras de direitos humanos”, observou.
Proposições
Após as palestras, os participantes inscritos apresentaram propostas para enfrentar os desafios debatidos. Janiere Portela, chefe de cartório da 2ª Zona Eleitoral do TRE-BA e pesquisadora, ressaltou que ações afirmativas devem ser acompanhadas do fortalecimento da capacitação feminina. Gicélia Ribeiro, estudante de Direito, sugeriu a criação de mais delegacias, nos âmbitos federal, estadual e municipal, para ampliar a fiscalização da violência de gênero.
A advogada Renata Mendonça, da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Político (ABRADEP), defendeu a ampliação de políticas como cotas de gênero, recursos financeiros para as mulheres e tempo de mídia proporcional em campanhas. Marleide Castro dos Santos, presidente do Sindicato dos Assistentes Sociais do Estado da Bahia, destacou que a busca pela paridade de gênero é essencial para garantir representatividade nos espaços de poder.
Jordanna Barreto, advogada da Procuradoria da Mulher da Assembleia Legislativa da Bahia (ALBA), convidou instituições a se unirem em treinamentos e eventos para formar lideranças políticas femininas. A deputada estadual Fabíola Mansur enfatizou a necessidade de punição para agressores de mulheres na política, especialmente nas eleições de 2026, visando garantir equidade de gênero e raça nos espaços de poder.
Exposição das autoridades
Na sequência, mulheres em cargos de liderança reforçaram a importância do tema. Entre elas, participaram a vice-prefeita e secretária de Cultura e Turismo de Salvador, Ana Paula Matos; presidente em exercício da ALBA, Ivana Bastos; a Conselheira do CNJ, Renata Gil; Maízia Seal Carvalho, desembargadora eleitoral; desembargadora do TJ-BA, Nágila Brito; Neusa Cadore, secretária estadual de Políticas para as Mulheres; Fernanda Silva Lordelo, secretária municipal de Políticas para Mulheres e Juventude; Thais Bandeira Oliveira Passos, da Comissão da Mulher Advogada da OAB-BA; e Sara Gama, promotora de Justiça e presidente do Núcleo de Enfrentamento às Violências de Gênero.
Carta de Salvador
O evento foi encerrado com a leitura da Carta de Salvador, documento que sintetiza as discussões e será disponibilizado à sociedade civil. Entre suas conclusões estão: a necessidade de um esforço coletivo para combater a violência política de gênero; o papel dos partidos políticos na democratização interna e na promoção da igualdade de gênero; a urgência de medidas repressivas contra essa prática; e a ampliação do acesso equitativo ao financiamento de campanhas femininas.
Pra todos verem: trezes pessoas enfileiradas lado a lado, de pé, atrás de uma mesa de eventos. Ao fundo, um painel com a inscrição: “Audiência Pública Mulheres e Cidadania”.